sábado, 20 de abril de 2013

Vive-te

[ Uma reflexão sobre ser e não ser que fiz aos dezoito anos. E que revi aos vinte. E depois aos vinte e três. E que resolvi postar hoje, aos vinte e cinco.Ela nunca parou de fazer sentido.]



Morrer.



É. É disso que eu preciso. De morrer.



Vida?



Era tudo muito...muito...muito. Ou seria muito pouco? Não queria mais repetir as palavras sem parar até que se tornassem estranhas ao pronunciamento de sua própria voz. Era muito complexa a simplicidade dos inexplicáveis lampejos que cortavam sua alma de quando em quando, durando o exato interminável tempo de um instante. Que começava e terminava bem ali, diante de seus olhos, sem que pudesse captura-los. Tocava-os assim. Mas eles logo escorriam por entre seus dedos e evaporavam.



Tempo?



Porque sabia-se dele apenas que passava. “O tempo passa”, não é? Quem disse? Quem disse que era esse o tempo? Não importa....Aprendia-se o que é tempo pelo movimento dos ponteiros do relógio, pelas folhas do calendário, pela contagem dos anos em coloridas velas reusáveis.

Mas nada tinha o tempo a ver com horas, ou dias ou anos. Concretizou-se algo abstrato ,e se impôs. Não tenho tempo para nada! - lhe diziam. Como se podia não ter algo que já não se tinha antes mesmo de tê-lo perdido? O que sabia é que já havia jogado as horas no lixo a muito...a muito...a muito tempo, por mais irônico que isso pudesse parecer para ela. O tempo não é igual, cada pessoa tem um tempo e cada tempo tem uma pessoa. Mania de quererem (ou seria querermos?) padronizar as coisas!

A falta de palavras que pudessem expressar o tempo a incomodava. Incomodava muito. Porque não existia.



E as palavras?



Aquelas que haviam sempre sido o seu refúgio, o único, voltavam-se agora contra ela por falta de existir. Elas limitavam-na, prendiam-na no previsível, na gaiola de onde sempre fugia para se encontrar com o conforto que a letras a traziam. Traidoras. Até elas, até as palavras haviam-na traído.

Tudo eram todos e nenhum nela e para ela se encaixava perfeitamente, assim como uma multidão que se move pela inércia alheia sem pensar.

“Eu vou, eu quero, eu sou”.

Eles todos repetiam constantemente para si, para não se esquecerem dos motivos. Os motivos. Os motivos. Que eram mesmo os motivos? Quais eram mesmo os motivos? Viver para. Esses eram os motivos. Viver para. Viver para algo. Viver então só é quando existe para alguém ou alguma coisa, viver pra si não se basta, viver é obrigatoriamente recíproco, se você der sorte, senão viver é um eterno amor não correspondido. Haveria sempre aquela saudade do que não existiu. Era assim desde o começo. E quem contestava? Quem contestava, quem contestava, acabava. Porque é esse o questionamento. E é tão vasto quanto é essencial, e por ser essencial não existe. Até o momento em que nasce! E morre. Assim mesmo prematuro, do jeito doído e proibido que nascera.

Queria viver-se a si mesma, apenas isto. Será que era pedir muito? Mas não se sabia viver-se, só matar-se. Não fazia sentido, como pode matar-se sem viver-se antes? Porque não existia. Não era dela porque tudo não podia ser, e a falta do palpável impalpável era infinitamente incomoda. Era esse o infinito dela. O infinito. O inexplicável infinito que fora criado já sem se saber o que era. Cria-se algo do qual não se sabe, nasce algo e não se sabe de onde, vai-se algo e não se sabe pra onde, e some-se também sem saber o que é.

Porque se acontecia sem acontecer?

Porque tudo era? Você não é... Sim, eu não sou. Ela não era, e era puramente isso. Era ser do não ser. Devia ser o que não era, mas era o que não devia, e tudo que queria era dever ser. Não dava, ela já era não ser, é quem não é, nunca poderá ser.

E precisava. Mas ninguém entendia o que era precisar. E precisava, e precisava e precisava e ninguém, nada, ou tudo lhe dava.

As lágrimas brotavam dolorosamente de seus olhos e iam expondo, a cada um delas, seu ser-não-ser que ao sair dela própria iam deixando de fazer parte do seu mim, do seu meu, do seu eu. E extinguiam-se. Ela ia se extinguindo a cada instante que externava. Seu pranto eram seus instantes.

Queria ter-se vivido, só isso, mas nunca ninguém havia querido viver-se, e era assim que não se enquadrava, por ser proibida de saber as regras de seu próprio existencialismo, já que nem ela mesma podia, por falta de existir, cria-las. Vivia-se ela assim, na sobrevida, inserida em seu próprio inexistente contexto(na falta de um real que lhe pudesse acolher). Ela era seu próprio contexto. Ela era seu próprio inexistente contexto. Ela era o instante que acabava sem, e não tinha fim.

Nada era perfeito, nada. Ou seria tudo? Mesmo sem existir o perfeito era. Seu contraponto, o imperfeito também era, mas era um indesejadamente ser, assim como ela. E a falta dessa perfeição lhe fazia falta, existia sem existir de fato.



De fato?



A minoria das coisas existia de fato, mas nem por isso deixavam de existir. Com ela era o contrário, ela existia de fato e assim, deixava de existir.

Cansava-se do cotidiano. Sempre com as mesmas e iguais mudanças imprevistas. Cansava-se de andar sem sentido e sem rumo para chegar sempre no mesmo lugar desconhecido, para o qual nunca queria ir, mas onde sempre acabava por se encolher de joelhos em algum canto. Internando seu não ser, como de costume.

Sua não existência ia deixando de existir, seu pranto secava acusando o que acontecia no seu interior. Era como se os sinais vitais de sua alma estivessem fraquejando e sem forças para continuar qualquer tentativa de entender o que não deveria ser entendido. Mas agora que era perguntado não havia mais volta. Porque não existia. Não existia volta das perguntas sem resposta.





[...]

Um comentário:

Anônimo disse...

Puts mafê...agora com esse texto vc me levantou um outro q eu, por meu turno, ainda não havia postado. Vou publicar...chama-se Decodificar. Vc vai entender pq tem td a ver...bj